domingo, agosto 15, 2010

RACIONALIDADE DO ATEÍSMO

Antes de os meus amigos cristãos me apedrejarem, esclareço que este título não representa propriamente uma concordância com um tal axioma. Pode designar apenas o assunto do presente texto, e que o autor, cristão, se pretende discutir. No entanto, sempre o autor pode admitir que mesmo nos antípodas, no ateísmo, há racionalidade. E também pode avançar duas restrições: embora assim admita, não há toda a racionalidade da parte dos ateus nem eles sempre são racionais, nem a racionalidade esgota todas as possibilidades de compreensão do mundo e o discurso sobre a mesma.
Esta reflexão prende-se com a natureza do Homem. A verdade é mais do que uma vez, quer através de conversas pessoais, quer de leituras em oblíquo em páginas na internet, se lhe deparou a contestação ateísta à alegada da criação do Homem por Deus, como sua imagem e semelhança, como defende o Cristianismo e está exarado na Bíblia. Em contrapartida, o Homem seria mesmo o pior, a coisinha mais ruim da criação. Ora, o autor subscreve por inteiro esta afirmação. E acrescenta que tal noção está igualmente na Bíblia. Ora, se os ateus não a lêem, ou só o fazem para nela provarem que não há Deus e que ela é um armazém confuso de contradições, o autor destas linhas pergunta onde terão achado esta ideia. Se a têm, é bom, mostra que, ao menos neste domínio, têm boa intuição. E acabam por dar razão à Bíblia, na qual não crêem e a qual não passa de uma amálgama de historietas e fábulas. Como?
É que nesta, pese embora se declare que o Homem é efectivamente imagem e semelhança de Deus, é-o não para o alçar a um pedestal de ídolo a honrar, mas porque essa foi a determinação divina, uma prerrogativa do Seu arbítrio que assim decidiu honrar a criatura. A glória é pois do Criador e não desta. E mais ainda: esse livro da carochinha é tudo menos meigo com essa criatura hedionda. Chama-lhe caída, corrupta, má, egoísta, inimiga de Deus, merecedora de ira e castigo divinos, e outros mimos. Embora seja preciosa aos olhos de Deus, porque criada por Ele. Como uma obra de arte é preciosa ao artista que a fez.

Temos, pois, que esses ateus querem ser humanistas: o homem como centro, acima de todas as coisas e medida de todas a coisas, das que são enquanto são e das que não enquanto não são, segundo o axioma do sofista Protágoras de Céos. O Humanismo (ou o Humanismo secular, como lhe chamam) é a sua doutrina. E isto suscita ao autor destas linhas uma questão, que ele tem de colocar, pois é inevitável, embora pedindo licença para o fazer, não vá ofender a laicidade que todos devemos confessar: se o Homem é a pior coisinha da Terra, como pode haver um Humanismo e ser essa nefasta criatura a medida de todas coisas? E outra pergunta ainda, partindo da mesma premissa: se o Homem é a pior coisinha da Terra, não estão incluídos os próprios ateus? Pois silogisticamente é necessário concluir que, sendo os ateus igualmente homens, são eles mesmos uns bichos peçonhentos. E o autor, sendo homem, também o é, coisa que ele, crendo na Bíblia, assume à partida. Nesse caso — outra pergunta, é incontornável — não será melhor esses ateus humanistas suicidarem-se? O que seria um sacrifício altruísta para bem de todas as demais criaturas e da Mãe Natureza (uma divindade adorada pelos ateus?), pois assim livrariam a Terra da sua peçonha.

Chegam ao ponto, esses ateus, de trocar a expressão optativa "se Deus quiser", por outra, mais humanista e ateia, "se eu quiser". Não por temor religioso, o autor destas linhas permite-se ao menos invocar a mais elementar razoabilidade. Pois ninguém, ateu ou religioso, pode dizer: "Amanhã vou à bola, se eu quiser". Pois nenhuma cabeça, religiosa ou empedernidamente, está livre de que ao sair de casa lhe suceda como ao George Clooney, e que um piado vindo do 3.º andar lhe caia em cima!

O Humanismo secular é pois um sucedâneo mal amanhado, na opinião modesta mas correcta do autor destas linhas. Ele prefere o Humanismo clássico, cristão, classicista, que frutos muitos mais doces, intelectuais e literários, deixou.

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