quarta-feira, março 28, 2012

OUTRA JERUSALÉM

“Construam casas para nelas habitarem; plantem hortas e comam do seu fruto.”
Jeremias 29:5

disseram-nos 
que construíssemos casas 
e as adornássemos de pomares
a toda a volta da nossa vista 
aí, dia a dia, faríamos amor 
até bisnetos nos nascerem 

disseram-nos 
que nessa terra ao plantarmos hortas
colheríamos paz, que muros 
não haveria que estancassem 
os nossos sonhos
nem o flagelo da fome nos puniria

e assim fizemos:
mesmo embutidos entre os rios
toda a terra 
é outra Jerusalém

26/03/12

terça-feira, março 27, 2012

BABILÓNIA

fora do mundo
descobrimos que há mundo
que há jardins e palácios
para lá do deserto
e também rios de águas vítreas

que para lá do choro e do riso
também há riso e choro
e que as lágrimas não são as últimas coisas
que derramamos
e que também aí a alegria se purifica

nunca imaginámos
que os caminhos do Senhor fossem
tão vastos e que o vento
levasse tão longe o aroma
do figo maduro

26/03/12

sábado, março 24, 2012

MEDITAÇÃO SOBRE O SALMO 137

recostamos os joelhos à beira dos rios
da Babilónia, os rios onde nem
os pés lavamos da marcha desde Sião,

mas os pensamentos vão lavados
e perambulam como corças
pela nudez acre da nossa terra
esfolada
perguntando aos rios se
haverá ainda por lá salgueiros em pé

é que nos arrancaram dos olhos
os contornos de Sião
e despojaram os nossos ombros
do linho de Jerusalém,
e nus nos deixaram
sem a túnica santa e branca que vestíamos
ao sábado

se de ti, Sião, a memória se escoar
nestas águas estranhas
que os dedos da minha mão direita
percam o tacto sejam como fantasmas
nas cordas da harpa

19/03/12

segunda-feira, março 19, 2012

MEDITAÇÃO SOBRE O SALMO 137

recostamos os joelhos à beira dos rios
da Babilónia, os rios onde nem
os pés lavamos da marcha desde Sião,

mas os pensamentos vão lavados
e perambulam como corças
pela nudez acre da nossa terra
esfolada
perguntando aos rios se
haverá ainda por lá salgueiros em pé

é que nos arrancaram dos olhos
os contornos de Sião
e despojaram os nossos ombros
do linho de Jerusalém,
e nus nos deixaram
sem a túnica santa e branca que vestíamos
ao sábado

se de ti, Sião, a memória se escoar
nestas águas estranhas
que os dedos da minha mão direita
percam o tacto sejam fantasmas
nas cordas da harpa

19/03/12

domingo, março 11, 2012

POR ONDE ANDA UM POEMA


Por onde anda um poema
um só esgaçado nas orlas da tarde?
um poema que não vá em modas
novas como uma brisa que não sacode
os nossos ombros

por onde anda um poema
um só capaz de rescender maresia?
dai-nos um desses à língua
sem lhe retirardes o sal

dai-nos esse pão nosso quotidiano
que perdoa todas as ofensas
e nos eleva às alturas do canto
a rasar as asas dos pássaros

buscamos esse poema
limpo da textura de água
em que a infância
encontre a sua casa

11/03/12

terça-feira, março 06, 2012

SEGREDO


Uma árvore tem sempre esperança; mesmo que a cortem, brota de novo e não pára de produzir rebentos.
Job 14:7

deixa-me contar-te,
criança velha,
o segredo da árvore

sempre de pé, mesmo quando
lhe deitam o tronco
e os ramos são separados do sol
mesmo quando suspendem
o abraço com o qual te consolavam
vegetal, e por isso
tão rente à terra

criança velha,
da árvore eis o segredo:
a raiz sempre permanece de pé,
apegada à fertilidade
do silêncio

6/03/12

NEVA EM VARSÓVIA

(a propósito de uma cena do filme O Pianista de Roman Polanski)

neva em Varsóvia
enquanto o fugitivo passa
com pés de pluma sobre as teclas
do piano dedo a dedo
sobre a cabeça enegrecida
que o chapéu esconde,

o fugitivo ao de leve entre os bicos
dos corvos e o piano é
à cautela uma labareda
sobre a cabeça enegrecida
mas mais negra ainda é a neve

1/03/12

domingo, março 04, 2012

NEVA EM VARSÓVIA

(a propósito de uma cena do filme O Pianista de Roman Polanski)

neva em Varsóvia
enquanto o fugitivo passa
com pés de pluma sobre as teclas
do piano dedo a dedo
sobre a cabeça enegrecida
que o chapéu esconde,

o fugitivo ao de leve entre os bicos
dos corvos e o piano é
à cautela uma labareda
sobre a cabeça enegrecida
mas mais negra ainda é a neve

1/03/12